quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

O Rio


Neste rio onde a memória se refresca,
Esta água que juventudes lavou,
Campos férteis a quem sede saciou,
A água de lágrimas que resta,
Essa lágrima que o mesmo rio secou!...

Naquele rio de desejo arcano,
Ondulavam teus cabelos de verdes limos,
Paixão amieiro de ramos finos,
Teimoso amor de resistente insano,
Rio de volúpia de desaguado oceano,
Louca história da qual rimos,
Vergonha corada de pecado venial,
Inocência perdida em paraíso fluvial,
Perdida num mergulho de infância feliz,
Felicidade suprema de maldade petiz,
Graciosa perda ausente de mal,
Que Deus fez e a Natureza quis!

A sombra do velho amieiro,
Sob o qual em paz adormecia,
Sempre ceifado, e sempre voltou,
Para o desejo da criança que sentia,
Igual desejo do salto verdadeiro,
Para o homem vaidoso e fiteiro,
Peito feito para o rio que se ria,
Pela barrigada do salto primeiro!


Penedo de homens já feitos,
Crianças de homens por fazer,
Pedras levemente submersas,
Flutuando em cada apeadeiro,
Aquele paraíso era lindo de ver,
Mergulhar e nadar sem receio,
Até faltar o ar dos folguedos,
Sinos das Trindades e outros medos,
Respeito talhado no pão de trigo, milho e centeio,
Porque nadar, correr, saltar dá fome;
Até um peixe se podia pescar,
Acender a fogueirinha para o assar,
-Só passa mal quem não come!
A água bebia-se mesmo ali,
Por bebê-la não vi ninguém adoecer,
Água corrente não mata a gente,
Três cruzes riscadas na água corrente,
Água pura que jamais pude beber!

Depois, à tardinha,
Quando o rio já era de prata,
Nadávamos nus na água fresquinha,
Porque o olhar não mata,
Mesmo quando elas nos viam a pilinha,
Sem maldade, sem pudor,
Seja lá isso o que for,
Apenas pela fluvial carícia,
Oferecendo um pouco de malícia,
Como quem faz o favor,
De ter a sorte atrevida,
De nadar com atrevida perícia!

Ai, água corrente,
Que toda a roupa suja lavava,
Na água onde o cueiro corava,
Um corar diferente,
Daquele que a alma sente,
E a língua também,
Ai a má língua da gente,
Que rio abaixo nada tão bem!


Naquele rio onde a memória se refresca,
Essa água que juventudes lavou,
Campos férteis a quem sede saciou,
A água da lágrima que resta,
Essa lágrima que o mesmo rio secou!...

1 comentário:

Anónimo disse...

Ainda por cima num dia especial, aniversário da Rita Sofia. Não sei como te rsponder ou agradecer te ou pedir desculpas nao sei porque, mal entendidos palavras por dizer mas cada vez estás mais "apurado" .Não sei é como. Porta bem.